TORNA-VIAGEM
Zeca Medeiros
Sendo um ouvinte de música há já largos anos, muito me passou pelos ouvidos ao longo dos tempos, começando pelos sons internacionais, vulgo música anglo-saxónica, que nos enche literalmente as rádios e as lojas de discos, passando por todo um conjunto de sons, que vão da música clássica até algum metal.
Desde pequeno que me habituei a ouvir alguma música portuguesa, claro está, mas sempre a (ou)vi, confesso que influenciado por algumas pessoas, como um sub-género da música. São os erros da juventude e da ignorância...
Com o passar dos anos, fui começando a saber dar o devido valor a alguns grupos portugueses - e digo alguns, porque há muitos que nem sequer se esforçam minimamente por construir boas letras e músicas... principalmente letras - e descobri algumas bandas de qualidade superior, para meu espanto. Sim, eu, tão habituado aos sons melodiosos (e relativamente fáceis) da língua inglesa desde miúdo, comecei a descobrir nomes como os Ornatos Violeta, infelizmente já história, os Clã, os Toranja e os Mesa (mais recentemente), só para citar aqueles que mais me agradam, isto para não referir os incontornáveis Rui Veloso, Jorge Palma, Sérgio Godinho ou José Afonso. No fundo, sempre contactei com alguma música portuguesa ao longo dos tempos. Subconscientemente.
Certo dia, tive o privilégio de ter entre mãos (e entre ouvidos) um certo álbum, intitulado "Cinefilias e Outras Incertezas", de um Senhor da minha Terra, com "S" grande (e Terra com "T" grande), chamado José (Zeca) Medeiros. Música feita nos Açores sempre foi, e ainda hoje é, quase um tabu para muita gente. Incompreensível.
Já conhecia o Zeca (vou chamá-lo assim) há alguns anos, através dos meus pais, amigos dele desde a adolescência, e já sabia do seu valor no que toca à realização de séries televisivas. Sempre admirei a forma como consegue encher o écran de emoções fortes, de sentimentos açorianos, como só Nemésio ou Antero. Do seu valor como músico, muito pouco sabia eu. Passo a explicar.
É que este álbum, o "Cinefilias" (chamemos-lhe assim, abreviando), reúne tudo o que o Zeca tem de bom. Cada tema, cada letra, cada melodia aparece como uma autêntica peça única, como episódio de uma das suas séries.
Ainda outro dia tive novamente o privilégio de ir assistir ao lançamento do seu novo trabalho, "Torna-Viagem", o que aconteceu no Hotel Camões, em Ponta Delgada. Se já saí de casa disposto a passar um excelente momento, voltei com vontade que aquele momento tivesse ficado suspenso no tempo... para sempre. Foi inacreditável a qualidade do espectáculo. Sala cheia de convidados e amigos, boa disposição e à-vontade, mas acima de tudo a música. Sempre a música. Se eu pensava que o "Cinefilias" já era excelente e muito dificilmente igualável, tal a sua magnitude, "Torna-Viagem" veio para me desenganar. É arte, pura e simples. Mais uma vez Zeca Medeiros conseguiu transportar toda a sua alma de cinéfilo, de músico, de escritor, de compositor, de actor para um pequeno círculo prateado. Pela segunda vez em 5 anos o fez.
A moral desta história toda é muito simples: se a música portuguesa é subestimada por muita gente, eu incluído (num determinado período da minha vida), a açoriana é muito mais. Todos os que assim pensam devem ouvir este trabalho, e o anterior também, do Zeca Medeiros. Devia haver uma disciplina nas escolas açorianas, desde a 1ª classe, de música açoriana. É que convidar certos artistas nacionais para dar concertos muito bonitos, cheios de maquilhagem, pompa e circunstância, pode ser politicamente correcto, mas esquecer o melhor e mais completo artista português dos últimos tempos devia ser considerado crime.
Já é hora de prestar a devida homenagem a este artista. Se há algo de que nos devamos e possamos orgulhar, nos tempos de hoje, é dos trabalhos que tem realizado ao longo dos tempos. Quer em televisão, quer na música, Zeca Medeiros tem marcado uma identidade açoriana, que tantos procuram saber o que é e porque existe.
1 Comments:
Tive a honra e o privilegio de ver e ouvir Zeca Medeiros no bar d'A Barraca. Não conhecia, nunca tinha ouvido falar. A musica envolveu-me de uma forma indescritível, as letras são de uma simplicidade que as torna grandes.Oiçam...!
20 de outubro de 2004 às 19:15:00 AZOST
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